Fundação Casa apaga velha Febem. Com esta frase o jornal Estado de São Paulo de 26 de abril último (p.C1) apresenta manchete a qual descreve mudanças positivas na configuração da instituição responsável em São Paulo pela guarda de jovens infratores.
Em um dos trechos afirma-se que os juízes só internam hoje casos realmente graves. Finalmente a “pressão das internações em massa”, como diz a matéria, foi derrubada e, ao que parece, somente resultados positivos advieram.
Um dos promotores da Vara de Infância e Juventude bastante experiente, Wilson Tafner elogia o trabalho e diz que “o sistema passou a funcionar e ganhou fluxo”. Sobre o modelo anterior, de internações a torto e a direito, diz o Professor Paulo Roberto da Silva, Livre Docente da USP, que “delinqüentes eventuais se misturavam aos contumazes e a contaminação era mortal”.
A demora foi de cerca de vinte anos para se perceber isto. O sistema do ECA é muito mais violento e grave do que o sistema penal. Não existe noção de “progressão de regime”, por exemplo. É internação e acabou-se.
Quando trabalhei na Febem em 2004 numa das coordenações da Assessoria Jurídica, sugeri muitas vezes que deveria se estabelecer um “fluxo”. Contudo, apesar das explicações sobre o significado de fluxo como um movimento semelhante ao da progressão de regimes da execução penal, entendiam os ouvintes (basicamente promotores e juízes) que a idéia era simplesmente aritmética. Vale dizer, permitia-se a saída de um interno (entenda-se mera liberação) para entrada de outro. Era um “fluxo” de internos, com numeração constante. Nada mais absurdo e sem sentido.
As modernas teorias da linguagem, aliadas às teorias penais, informam que num sistema fechado a comunicação humana se realiza em plenitude, de acordo com o ambiente formado. Parece muito óbvio, quase um truísmo infantil, mas ainda hoje muitos não entendem isto.
Quando se fala em sistema carcerário, fala-se num ambiente em que há uma atmosfera de conteúdos semânticos, ou seja, um espaço (que inclui a noção de tempo) no qual se estabelece determinado modo de compreensão do mundo ou cosmovisão. As idéias ali estabelecidas acabam por moldar todos os que convivem naquele ambiente, configurando a personalidade individual, inserindo nesta um modo comum de ver o mundo, quase com os mesmos “valores”. Em resumo, o interno é moldado a ser criminoso juvenil. Mesmo sendo curto o período – internação de três anos – ele é mais que suficiente para “educar” o futuro criminoso.
Romper este ciclo é algo muito difícil e o modelo educativo proposto era e ainda é inadequado, tanto que, mesmo com a nova visão divulgada, os resultados positivos ainda são pequenos.
Finalmente, de acordo com a matéria, entenderam os juízes que há necessidade de maior uso dos institutos da liberdade assistida e da semiliberdade. Internação só casos gravíssimos.
O ECA exige reforma em seu modelo infracional. Assinei em conjunto com outro colega uma proposta de reforma, visando modificar os institutos existentes para um formato mais eficaz, sem grandes alterações estruturais, a fim de se evitar custos elevados. A proposta foi encaminhada em 2007 como projeto de lei pelo então deputado Clodovil Hernandes, hoje falecido, recebendo o número PL 820/2007 e está em andamento no Congresso Nacional.
É urgente que a questão da criminalidade infanto-juvenil seja discutida para se tentar encontrar soluções, as quais serão certamente de implementação demorada. Discussões que não trarão resultados positivos, como a da alteração da maioridade penal, precisam ser interrompidas. Tomara que o exemplo da nova Fundação Casa traga novos ares ao enfrentamento do tema.
Em um dos trechos afirma-se que os juízes só internam hoje casos realmente graves. Finalmente a “pressão das internações em massa”, como diz a matéria, foi derrubada e, ao que parece, somente resultados positivos advieram.
Um dos promotores da Vara de Infância e Juventude bastante experiente, Wilson Tafner elogia o trabalho e diz que “o sistema passou a funcionar e ganhou fluxo”. Sobre o modelo anterior, de internações a torto e a direito, diz o Professor Paulo Roberto da Silva, Livre Docente da USP, que “delinqüentes eventuais se misturavam aos contumazes e a contaminação era mortal”.
A demora foi de cerca de vinte anos para se perceber isto. O sistema do ECA é muito mais violento e grave do que o sistema penal. Não existe noção de “progressão de regime”, por exemplo. É internação e acabou-se.
Quando trabalhei na Febem em 2004 numa das coordenações da Assessoria Jurídica, sugeri muitas vezes que deveria se estabelecer um “fluxo”. Contudo, apesar das explicações sobre o significado de fluxo como um movimento semelhante ao da progressão de regimes da execução penal, entendiam os ouvintes (basicamente promotores e juízes) que a idéia era simplesmente aritmética. Vale dizer, permitia-se a saída de um interno (entenda-se mera liberação) para entrada de outro. Era um “fluxo” de internos, com numeração constante. Nada mais absurdo e sem sentido.
As modernas teorias da linguagem, aliadas às teorias penais, informam que num sistema fechado a comunicação humana se realiza em plenitude, de acordo com o ambiente formado. Parece muito óbvio, quase um truísmo infantil, mas ainda hoje muitos não entendem isto.
Quando se fala em sistema carcerário, fala-se num ambiente em que há uma atmosfera de conteúdos semânticos, ou seja, um espaço (que inclui a noção de tempo) no qual se estabelece determinado modo de compreensão do mundo ou cosmovisão. As idéias ali estabelecidas acabam por moldar todos os que convivem naquele ambiente, configurando a personalidade individual, inserindo nesta um modo comum de ver o mundo, quase com os mesmos “valores”. Em resumo, o interno é moldado a ser criminoso juvenil. Mesmo sendo curto o período – internação de três anos – ele é mais que suficiente para “educar” o futuro criminoso.
Romper este ciclo é algo muito difícil e o modelo educativo proposto era e ainda é inadequado, tanto que, mesmo com a nova visão divulgada, os resultados positivos ainda são pequenos.
Finalmente, de acordo com a matéria, entenderam os juízes que há necessidade de maior uso dos institutos da liberdade assistida e da semiliberdade. Internação só casos gravíssimos.
O ECA exige reforma em seu modelo infracional. Assinei em conjunto com outro colega uma proposta de reforma, visando modificar os institutos existentes para um formato mais eficaz, sem grandes alterações estruturais, a fim de se evitar custos elevados. A proposta foi encaminhada em 2007 como projeto de lei pelo então deputado Clodovil Hernandes, hoje falecido, recebendo o número PL 820/2007 e está em andamento no Congresso Nacional.
É urgente que a questão da criminalidade infanto-juvenil seja discutida para se tentar encontrar soluções, as quais serão certamente de implementação demorada. Discussões que não trarão resultados positivos, como a da alteração da maioridade penal, precisam ser interrompidas. Tomara que o exemplo da nova Fundação Casa traga novos ares ao enfrentamento do tema.
Um comentário:
Os menores infratores representam um significativa parcela daqueles que serão adultos criminosos no futuro, razão pela qual este avanço da Fundação Casa no tratamento dessas crianças e adolescentes deve ser comemorado e acompanhado pelos demais Estados da federação e sempre melhorado, buscando dar aos menores chances de mudar o seu destino.
Mauro Roberto Martins Junior
Postar um comentário