O debate levanta duas questões importantes, sobre o reflexo
moral de um crime e sobre as relações entre este e o direito de defesa.
Para
que um Estado de Direito seja garantido em suas estruturas, a defesa não pode
ser analisada sob a perspectiva moral. Não porque direito e moral não dialoguem, mas porque o
direito subjetivo de defesa forma junto com outros princípios a base estrutural
da democracia moderna.
Como princípio, a defesa é reconhecida
"universalmente" como valor, sempre tendo em vista uma democracia. Já
o quadro moral, apesar de possuir obviamente princípios, no Estado de Direito,
não alimenta os seus alicerces mas somente a dinâmica social (por isso existem
discussões sobre aborto, uniões homoafetivas etc).
O Estado de direito, sendo plural, não reconhece um quadro
moral fechado como legítimo. Obviamente matar alguém e, principalmente nas
condições odiosas desse crime, é visto praticamente de forma universal como
"errado".
E aqui se centra a raiz da pergunta: apesar de ser
moralmente "errado", no Estado Democrático de Direito, pode deixar-se
o agente não exercer o direito de defesa? A resposta é negativa. O direito de
defesa tem de ser respeitado. Note-se nesse caso que os advogados não se
apresentaram, mas os acusados serão defendidos pela defensoria pública, como
noticia a matéria.
E aqui há outro aspecto. Pode a Índia ser considerada um
Estado de Direito democrático nos moldes pregados globalmente quando ainda se
sustenta sob uma dinâmica social de castas? Se a resposta for negativa, a
atitude dos advogados é muito mais profunda, pois eles não estariam
simplesmente fazendo juízos morais.
Ao negar colaboração ao direito de defesa, estariam
questionando a estrutura democrática de seu país, que possibilita o
incompreensível e brutal ato de se afrontar contra a liberdade e a vida de uma
mulher, tida, conforme divulgado, como um ser social menor a ponto de ser
vilipendiada de forma visceral, violenta e mortal em sua dignidade e
existência.
Com este gesto os advogados indianos questionam outro
princípio, o da dignidade e o valor da vida humana, principalmente a do gênero
feminino.
Leia a matéria na Folha de São Paulo
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